segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Povo Àwa - Certeza Incerta


Fotos: Diego Janatã



foto: Diego Janatã



Povo Awá – Certeza incerta


             Estive nesse final de semana na aldeia juriti, do povo Awá-Guajá na Terra Indígena Awá. Nessa aldeia vivem cerca de 40 índios Awá, como se autodenominam, termo que significa “homem”, “pessoa” ou “gente”. E “gente” é como se sente quem, de alguma forma, tem contato com esse povo. Parece-me que aqui, o conceito e a relação etnocêntrica toma um outro sentido, ou melhor, tem duas direções. Se desloca do eu para o não-eu. É na relação com o outro que me torno “mais gente”. Pois foi assim que me senti, e também me dei conta do quanto nos distanciamos de nossa natureza humana, ou de nossa essência verdadeiramente humana. Parece ser essa a linda missão dos Awá nessa terra.

            Num certo momento de nossas andanças na floresta, deparamo-nos com uma índia Awá com sua aparência já idosa, que vestia apenas uma saiota que tampava somente suas genitálias, ao nos avistar, tampou suas narinas com as mãos e se distanciou. Aquele gesto me tocou profundamente, pois a sua casinha, o “tapiri”, feita somente de palha, com uma rede armada e uma fogueirinha que ainda fumaçava, ao nosso olhar, mediado por outros valores, ou des-valores, via-se ali um sinal de primitividade, do anti-higiênico, e pelo contrário, foi assim, que eu mesmo me vi. Olhei pra meu corpo e percebi um corpo carregado das mais variadas ameaças biológicas para a sobrevivência dos Awá. Conscientemente ou não, essa índia me fez, apesar do uso de colônias do Boticário, dos shampoos e hidratantes da Natura, “menos” pra me tornar “mais”.

               Athos do grego Athé, que coincidentemente é o nome de meu filho que significa “Inocência de espírito” é oportuno, se quisermos tentar caracterizar esse povo meigo, de um sorriso infantil. Uma inocência não passiva, ou seja, aquela inocência que faz parte da alma de um guerreiro, que sabe agir e reagir a qualquer tentativa de sua total anulação.

             Atualmente vivem na Pré-Amazônia brasileira, mas precisamente na região noroeste do Maranhão e constituem um dos últimos povos caçadores e coletores no Brasil. Além dos aldeados pela FUNAI, alguns ainda vivem na floresta, sem contato permanente com a sociedade regional, dentro das Terras Indígenas Alto Turiaçu, Araribóia e Caru segundo foram observados pelos Guajajara e Ka’apor, que também são do mesmo tronco lingüístico Tupi, resaltando aqui que este ùltimo povo os Ka’apor foram por muito tempo inimigos mortais dos Awá. Existindo períodos de guerra contra os Awá. Há também informações de grupos de Awá-Guajá mais distantes que se movem por uma série de serras e chapadas que ligam os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí, Goiás, Bahia e Minas Gerais. Sendo que este eixo, tem servido como refúgio natural para os Guajá e já conduziu alguns indivíduos até Bahia e Minas Gerais.

              Povo esse que para viver sua autonomia, manteve-se por quase 500 anos sem contato com a tal “sociedade envolvente”.  No entanto, após contactados e demarcada uma área de reserva florestal que viesse garantir a sua reprodução física e cultural, vivem, hoje, um grande drama. Essa área foi e ainda está sendo invadida por grileiros, colonos e fazendeiros ligados a grandes grupos agropecuários dos estados do Pará e Maranhão.  E como de costume por aqui, grupos esses, por sua vez, ligados a madeireiros e políticos da região. Como se vê no noticiário:
        “O presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, Jirair Aram Meguerian suspendeu a decisão judicial emitida pelo  juiz José Carlos Madeira, da 5ª Vara Cível da Justiça Federal no Maranhão, que obriga a empresa Agropecuária Alto Turiaçu Ltda, do Grupo Schahin – assim como todos os ocupantes não-índios –, a retirar-se da Terra Indígena Awá-Guajá.
A suspensão, ocorrida em 23 de outubro, atendeu pedido da Prefeitura Municipal de Zé Doca, alegando que a retirada iria prejudicar economicamente a região. Porém, o caso não termina assim, pois o Supremo Tribunal Federal ainda vai julgar os recursos sobre a decisão da Justiça Federal, e a partir daí os invasores terão um prazo de seis meses para sair da área.” (jornal vias de fato).
Recebi essa notícia logo no domingo à noite, ao chegar da aldeia juriti. Uma tristeza profunda me tomou conta. Mas como diz a estrofe da música “A Bandeira” de Ivan Lins:
“Que o perdão seja sagrado
Que a fé seja infinita
Que o homem seja livre
Que a justiça sobreviva “

              Que o Estado de Direito não possa continuar a serviço do capital. Pois, historicamente em nosso país, tem-se travado uma luta entre os que lutam por seus direitos e do outro lado os que buscam os seus interesses. Até quando!
              Vivemos aqui, um Estado sem o Estado. É a lei do Capital, que é sinônimo de miséria, violência e fome, a negação da vida.
Mas que possa prevalecer a VIDA!
Viva os Awá-Guajá! Para que possa viver a HUMANIDADE, ou pelo menos o que ainda há de HUMANO entre nós.
Que @ Grande Maíra proteja os Awá-Guajá.
* Cleidson Pereira Marinho
*Estudante do Curso de Licenciatura em Educação do Campo - Ciências Agrárias da UFMA e colaborador da FUNAI-CPTI na Operação Arco de Fogo.



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