domingo, 5 de junho de 2011

MARCIO Vasconcelos

A Imagem da Mina Nagô


Filha de santo da Casa de Nagô, pelas lentes de Márcio Vasconcelos

Eduardo Júlio · São Luís, MA
2/8/2007 · 301 · 22
A Casa de Nagô, um dos principais terreiros de culto afro de São Luís, terá registro em livro de fotografia e história. O projeto “Nagon Abioton – Um Estudo Fotográfico e Histórico sobre a Casa de Nagô” foi idealizado pelo fotógrafo maranhense Márcio Vasconcelos, 49, obtendo aprovação no mais recente Programa Petrobras Cultural.


A finalidade é apresentar a trajetória e as atividades do terreiro, através de textos e imagens. A Casa de Nagô, localizada no festivo e cultural bairro da Madre Deus, na área do Centro de São Luís, é considerado um dos terreiros matrizes do culto afro-maranhense tambor de mina, que possui importância semelhante ao candomblé, da Bahia. Sabe-se que a casa teria sido fundada por “malungos” africanos, sendo a Mãe Josefa, a fundadora do culto no final do século XVIII. “Trata-se de um dos terreiros mais tradicionais e dele se derivaram diversas outras casas de culto, da mesma linhagem, no Maranhão”, explica o fotógrafo.



Além de Márcio Vasconcelos integram a equipe de produção do livro, o poeta e jornalista Paulo Melo Sousa, o pesquisador Sebastião Cardoso Junior e a antropóloga Mundicarmo Ferretti. 
Márcio explica que apesar da importância e do prestígio, no momento, a Casa de Nagô enfrenta diversas dificuldades, como o pouco número de dançantes (mãe e filhas de santo) em atividade no local. Há somente quatro, todas entre 80 e 100 anos de idade, que integram o terreiro sob o comando de Dona Maria Lúcia, de 102 anos, a chefe da casa. Além disso, por dificuldades financeiras, elas não conseguem cumprir o calendário anual de festas. “Há pouco tempo existia um número significativo de dançantes, mas a quantidade diminuiu drasticamente, por morte ou por incapacidade física”, diz.



Ele acrescenta que há diversos trabalhos acadêmicos sobre a Casa de Nagô, porém não existe nenhum registro semelhante ao proposto pelo projeto dele. “Esta foi uma das razões para idealizarmos este livro, com registro imagético e literário. O objetivo é mostrar todas as festas realizadas pelo terreiro, com prioridade para a memória oral, colocando a voz das mães de santo”.



O fotógrafo enfatiza que mesmo com a finalidade de cobrir todas as atividades da casa, a parte imagética do livro priorizará a linguagem da arte. “Não será um trabalho narrativo ou didático e sim estético. Mas é claro, todas as filhas e mães de santo terão o seu retrato”. 



Segundo Márcio Vasconcelos, serão relatados detalhes acerca do culto, como cânticos, rituais, alimentos utilizados, plantas sagradas de cunho ritualístico, danças, entre outros elementos.



Ele conta que desde quando começou a fotografar, há quase 20 anos, registra os festejos e atividades das principais casas de tambor de mina de São Luís. “Acompanho de perto outros terreiros, mas a minha aproximação com a Casa de Nagô ainda é tímida. Por isso, a primeira etapa do projeto é criar um forte vínculo de amizade com as filhas e mães de santo do local”, ressalta.



FESTAS
As festas dedicadas ao vodum Jêje Sobô, deusa dos ventos e da tempestade, sincretizada com Santa Bárbara, no mês de dezembro, e ao vodum Xapanã, relacionado com a entidade gentil Rei Sebastião, sincretizado com São Sebastião, em janeiro, são alguns dos festejos que integram o ciclo anual da casa.



ORIGEM
Relatos apontam que o tambor de mina se origina da cultura dos negros do Reino de Daomé, atual Benin, por causa do porto de São Jorge de Mina, de onde teriam partido a maioria dos negros que vieram escravizados para o Maranhão. Deles, surgiram dois segmentos étnicos, diferenciados pelo dialeto: mina Jêge e mina Nagô.



ARTESANATO
Além do futuro livro sobre a Casa de Nagô, Márcio Vasconcelos preparou uma publicação sobre o artesanato maranhense, “Arte nas Mãos – Mestres Artesãos Maranhenses”, que foi aprovada na Lei Rouanet e está pronta, mas espera recursos para a impressão. 
“O livro destaca a figura dos artistas. Não é um trabalho sobre objetos, mas de pessoas que confeccionam peças de artesanato”, define o fotógrafo.



A publicação vai abranger mestres que trabalham com cerâmica, madeira, fibras vegetais, artesanato indígena e arte do bumba-meu-boi, de todas as regiões do Maranhão. Foram registrados aproximadamente 50 artesãos. Para realizar o projeto, Márcio Vasconcelos contou com o auxílio do pesquisador Jandir Gonçalves, um dos mais importantes de São Luís, e novamente com o poeta e jornalista Paulo Melo Sousa. “Este livro estava aprovado para ser impresso com recursos do Sebrae, mas com a mudança da diretoria da instituição, o projeto foi suspenso”, explica. 



O AUTOR
Nascido em São Luís, Márcio Vasconcelos é fotógrafo independente e se dedica a registrar as manifestações da cultura popular do estado. Costuma atender a várias agências de publicidade de São Luís e de forma paralela desenvolve projetos autorais em comunidades negras quilombolas, colônias de pescadores e aldeias indígenas do interior do Maranhão. 



A primeira exposição individual dele, intitulada “Filhos da Lua”, tratava da comunidade de pescadores da Ilha dos Lençóis (não confundir com Lençóis Maranhenses). A mostra foi apresentada em 1992, no Centro de Criatividade Odylo Costa, filho, em São Luís. A mais recente, “Brilho de São João – Registro do Bumba-Meu-Boi do Maranhão” esteve em cartaz no Museu do Bonde, no Rio de Janeiro, em 2007. Entre as revistas que Márcio Vasconcelos já colaborou, constam Caminhos da Terra, Viagem e Turismo, Exame e Você S/A. 

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